A agenda diz-nos que ainda faltam cerca de quatro meses para a terceira edição do HaHaArt Film Festival, no entanto, há toda uma equipa a trabalhar afincadamente para que, entre 24 e 27 de Outubro, Pombal se transforme no epicentro da cultura do cinema de comédia.
Em conversa com o director do festival, Manuel Oliveira revela-nos que para este ano estão a ser trabalhadas diversas novidades, não só com a dinamização de mais dois dias de actividades, como com a introdução de mais sessões de cinema para os mais novos, mais conversas com profissionais da área e mais entretenimento.
Sendo o único festival em Portugal exclusivamente dedicado ao cinema de comédia, Manuel Oliveira, admite que ainda existem “muitos preconceitos” a pairar sobre a comédia, mas que se sente “um renascer do género”, com novos realizadores e novos filmes “na vanguarda do cinema internacional”.
TERRAS DE SICÓ (TS) – Que balanço faz, até ao momento, da submissão de filmes para a edição deste ano o HaHaArt Film Festival? Como descreve a evolução do festival ao longo das suas edições?
MANUEL OLIVEIRA (MO) – Este ano já recebemos mais de 250 submissões. Sendo a terceira edição do festival, já não ficamos tão impressionados com a diversidade na origem dos filmes. Dito isto, este ano já tivemos submetidos filmes de 47 países diferentes e ainda falta cerca de um mês para fechar a nossa open call.
TS – Como está a correr o processo de selecção? Em linhas gerais, o que procuram num filme para a sua integração no festival?
MO – O nosso processo de selecção é dividido em duas partes. A primeira onde vemos todos os filmes, e aí somos um grupo de nove pessoas. Nessa primeira fase faz-se essencialmente a separação dos filmes em termos de género, sobrando os filmes que são efectivamente comédias, que pode ser mais difícil de definir do que se possa imaginar, especialmente tendo em conta a variedade autoral e de origem dos filmes que submetem para a competição do festival. Depois, para programar a partir da shortlist resultante desses primeiros visionamentos em grupo é feito um trabalho muito mais cuidado numa equipa de três pessoas, onde toda uma série de critérios são aplicados desde a duração até ao tema.
TS – Pode dizer-se que a qualidade dos filmes recebidos tem aumentado? Há surpresas (positivas ou negativas)?
MO – A percentagem de excelentes filmes tem aumentado, sim. Isto complica o processo de selecção, que ainda não estando terminado este ano, já está a ser muito mais difícil por isso mesmo. A verdade é que desde a primeira edição que temos vindo a receber muitos filmes de qualidade, alguns deles com validação e reconhecimento noutros festivais internacionais ‘maiorzinhos’, outros ilustres desconhecidos, mas no fundo tem sido com muito gosto que neste processo de programação estamos permanentemente a redescobrir este género cinematográfico.
TS – Quais são os principais destaques e novidades que o público pode esperar da edição deste ano?
MO – Estamos a trabalhar em vários aspectos novos do festival. Com mais dois dias, contamos trazer outro tipo de conteúdos. Exibições de filmes em contexto fora de competição, nomeadamente longas-metragens, mais conversas, e mais sessões para os mais novos são algumas das novidades que podemos revelar para já. Estamos também a trabalhar para que haja um workshop/masterclass durante os dias do festival, mas ainda é cedo para falar de mais detalhes.
TS – Inicialmente, a direcção do festival falava muito na comédia como sendo um “género subvalorizado”. Acreditam que esse estigma continua presente na sociedade e até mesmo na cinefilia?
MO – Continuamos a achar que há muitos preconceitos para com o cinema de comédia, tanto na sociedade como na cinefilia. Mas nestes últimos anos tem havido um renascer do género. E não é só um renascer saudosista ou nostálgico: existem de facto novos realizadores e novos filmes dentro do género que estão na vanguarda do cinema internacional.
TS – De que forma é que o HaHaArt Film Festival está a contribuir para combater esse estigma?
MO – O nosso objectivo é enfatizar o sentido de novidade dentro do género, e de como este se reinventa permanentemente. Isto tudo enquanto simultaneamente lembramos o impacto do género e dos seus mecanismos na história do cinema e na própria cultura cinematográfica. Queremos que seja esse o nosso contributo, e que tenha impacto na produção cinematográfica nacional também, impacto que sabemos inclusivamente já ter existido. Em suma, ver e rever cinema, às vezes “às cegas” e sem saber bem para o que se vai é importante para crescermos culturalmente como espectadores e como sociedade, e isso não é diferente para um festival de cinema de género como o nosso. É verdade que o nosso espectador sabe bem o que é comédia, que há risos e sorrisos envolvidos neste género cinematográfico. Às vezes podem é pensar que já sabem como é que se chega a esses risos e sorrisos, e é o nosso trabalho também mostrar que há muitos artistas e cinéfilos com um controlo absoluto desses mecanismos e preocupados com a sua constante reinvenção, e que fazem filmes cheios de novidade, imprevisíveis e completos.
TS – Falando em portugalidade, de que forma o HaHaArt Film Festival quer contribuir para promover e destacar o cinema nacional de comédia?
MO – Em conjunto com o Cineclube de Pombal (CCP), que também inclui curtas-metragens na sua programação, percebemos que a curta-metragem é uma porta fundamental para a descoberta de novos autores e artistas, e à qual infelizmente o acesso é reduzido. O HaHaArt Film Festival vai continuar a ter uma secção competitiva dedicada ao cinema nacional. Este ano vamos também dedicar uma das nossas sessões a uma miniretrospectiva de um realizador português de cinema de animação, também de curtas-metragens, que vamos revelar numa data mais à frente. Haver no nosso festival um espaço para que os realizadores portugueses, especialmente os que estão em início de carreira ou com maiores dificuldades de distribuição do seu filme, pensamos ser o maior contributo do HaHaArt Film Festival.
TS – O HaHaArt Film Festival apresenta-se como o único evento dedicado ao cinema de comédia que decorre em Portugal. Quais são as maiores dificuldades/adversidades que sentem na organização de um festival deste género?
MO – O trabalho de programação é simultaneamente facilitado e complicado pela natureza do festival ser de género. Facilitado porque no vasto universo do cinema, estamos focados numa mão cheia de galáxias que é o género da comédia. Complicado porque como já referimos antes há muitos preconceitos e expectativas sobre o género. O HaHaArt Film Festival não gosta de preconceitos, sejam eles bons ou maus, e está focado em quebrá-los. E achamos que isso é uma coisa boa. O problema são as expectativas. O mundo do cinema de comédia é vastíssimo, e, particularmente com filmes com proveniência de países mais diferentes do nosso, alguma nuance é perdida no que toca às características do género da comédia. Há uma imensidão de filmes verdadeiramente incríveis que são classificados no contexto de festivais de cinema como comédias, onde por vezes é difícil perceber “onde está a graça”. E depois há casos de filmes que são hilariantes mas que pouco ou nada têm de cinema. Tudo isto é são linhas ténues que nos obriga constantemente a estudar e perceber com a maior clareza possível os vários tons, temas e nuances de cada filme. E se para nós às vezes é difícil perceber porque é que o filme X ou Y foi considerado neste ou naquele grande festival como sendo comédia, compreendemos que assim seja também para o público. No final, queremos aprender em conjunto com os espectadores que venham às nossas sessões. Aprender sobre isto do que é o cinema de comédia, e fazer – quando as obras e artistas assim o exigem – o tal paradigma shift que achamos necessário na percepção deste cinema.
TS – Para terminar, como é que o HaHaArt Film Festival pretende continuar a evoluir e a destacar-se no cenário internacional da comédia?
MO – Este projecto quando começou foi sempre com a ambição de expandir. Para já, expandimos de três para cinco dias, com mais conteúdos para que os nossos espectadores e participantes desfrutem. Vontade de mostrar mais coisas e criar novas actividades nunca foi um obstáculo dentro do CCP e na organização do festival. Estamos a trabalhar para que haja mais fontes de financiamento que permitirão esse crescimento, para além dos vários patrocinadores e parceiros que já nos apoiam, mas nunca é fácil!
É difícil prever o futuro, mas vamos continuar em crescente na medida em que encontremos essa vontade no público e sucesso nas dinâmicas criadas pelo festival, e haja (que há) força de vontade para continuar com o projecto avante. Acreditamos no HaHaArt Film Festival e no seu potencial de ser um dos festivais de cinema de destaque no paradigma nacional.
ANA LAURA DUARTE
[NOTÍCIA DA EDIÇÃO IMPRESSA]
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