A ansiedade e o receio atormentam, por estes dias, as gentes da freguesia de Anobra, no concelho de Condeixa, preocupadas com a futura linha ferroviária de alta velocidade que se perspectiva lhes vá ‘bater à porta’ com estrondo e consequências ainda por apurar em toda a sua extensão. As freguesias de Ega e Sebal/Belide também sofrem com o impacto do projecto, embora o desfecho se antecipe menos gravoso.
Pelo menos cinco casas de habitação serão destruídas na freguesia de Anobra para ceder passagem ao comboio. Esta é já uma certeza e resulta da análise do estudo de impacte ambiental que se encontra, até ao final deste mês, em fase de consulta pública na plataforma www.participa.pt.
O troço entre Soure e Oiã (Oliveira do Bairro), que atravessa três freguesias do concelho de Condeixa, é o lote B da ligação entre Porto e Soure e corresponde à primeira fase da linha de alta velocidade Porto-Lisboa.
O traçado proposto, vindo do concelho de Coimbra, apresenta três opções em estudo para o atravessamento da freguesia de Anobra, avaliando-se agora os impactos no território. Uma (Eixo 3.2) que afectará o Casal do Carrito e é o troço mais próximo da sede da freguesia; outra mais afastada (Eixo 3.1), que “dizima” Casal Seco; e ainda uma terceira (interligação 3.1 e 3.2), a meio dos dois eixos anteriores, a atingir Alvogadas.
Por entre o edificado que a obra obrigará a ir abaixo, há várias casas de habitação, identificadas no extenso material disponibilizado à consulta pública. Assim, se a opção vier a ser o Eixo 3.1, a aldeia de Casal Seco terá cinco residências a irem abaixo, deixando o lugar praticamente deserto (sobrará uma habitação), enquanto a opção pelo Eixo 3.2 destrói uma dúzia de habitações em Casal do Carrito, para além de anexos, capela e associação recreativa.
Na opção intermédia (troço sai do Eixo 3.1 e entronca no 3.2), será Alvogadas a sofrer as maiores consequências com seis habitações fatalmente penalizadas.
A avaliação de impacte ambiental considera a opção que afecta Casal do Carrito como a “globalmente menos favorável”, apontando a alternativa-Casal Seco como a “globalmente mais favorável ambientalmente, o que se prende com o facto de ser mais vantajosa em todos os descritos relacionados com a componente humana”. Ainda assim, “esta alternativa surge como a menos favorável nas questões que se prendem directamente com o atravessamento do Paul de Arzila”.
Para os técnicos que elaboraram o estudo, a alternativa-Alvogadas “apresenta igualmente grande viabilidade”, com a vantagem de evitar a intersecção das zonas de conservação e protecção especiais do Paul de Arzila.
À entrada da União de Freguesias de Sebal e Belide, as opções reduzem-se a duas alternativas de traçado, qualquer uma delas em área florestal, entre Rapoila e Venda da Luísa, não atingindo casas de habitação.
Já na freguesia de Ega, está definido um único percurso entre Casével e Campizes, abrindo novamente as opções a dois traçados em avaliação à passagem próximo de Casal do Missa, rumo ao concelho de Soure, igualmente em área florestal e não obrigando à demolição de habitações.
“O facto de não haver casas a serem postas em causa alivia toda a gente”, congratula-se o presidente da Junta de Freguesia de Ega, Rodolfo Silva, embora convicto que a proximidade do traçado à aldeia de Casével venha a ter impacto na vida das populações.
De acordo com o estudo apresentado, o impacto ao nível do ruído será atenuado pela construção de ‘barreiras acústicas’.
Para o autarca, a opção pelo Eixo 1 (trajecto mais próximo a Casal do Missa), “provavelmente é a que terá menos impacto”, por afectar um menor número de proprietários florestais.
Com a fase de consulta pública a terminar no final do mês e um “processo muito complexo” pela frente, o trabalho da Junta de Ega tem sido “tentar facilitar à população o conhecimento e a leitura dos documentos, para que as pessoas fiquem despertas para as opções do traçado”, refere Rodolfo Silva ao TERRAS DE SICÓ.
Anobra quer “desvio ligeiro”
Uma sessão de esclarecimentos (muito concorrida) sobre a consulta pública, por técnicos da Câmara de Condeixa, juntou a população em Anobra, na passada quarta-feira (5), tendo ficado evidentes os receios existentes.
“Afecta a minha terra, é das freguesias mais afectadas no concelho de Condeixa, por isso tenho de estar muito preocupado”, resume o presidente da Junta, João Carlos Lameiro.
O autarca concorda que “uma das soluções [Casal do Carrito] é muito impactante para a freguesia, afecta muitas habitações e seria caótico se avançasse”.
João Carlos Lameiro defende também um “desvio ligeiro” do traçado, “o que nos parece possível”, na opção-Casal Seco, para poente ou nascente, permitindo, assim, poupar as habitações.
“Parece-nos haver a possibilidade de um traçado que não afecta as habitações, por isso, vamos estudar e propor, em articulação com a vizinha União de Freguesias de Arzila, Ameal e Taveiro [concelho de Coimbra], porque se estivermos concertados nas posições será mais fácil termos êxito, e tentar que o prejuízo seja o menor possível”, salienta o autarca. Um abaixo-assinado a repudiar a opção-Casal do Carrito e a sugerir uma pequena alteração do restante traçado deve avançar nas próximas semanas.
O presidente da Câmara, Nuno Moita, também se manifesta preocupado com as consequências do projecto, embora reconheça “a importância da alta velocidade em Portugal, algo que o país não apostou ao longo dos anos, mas tenho de reconhecer que nos últimos anos o governo do PS tem feito um grande esforço para voltar a investir na ferrovia”.
“A Câmara será sempre um agente na defesa dos interesses da nossa população”, assegura o autarca, convicto de que a opção-Casal do Carrito está “praticamente excluída”.
A antever o impacto do projecto da alta velocidade na vida quotidiana das gentes locais, Luís Martins, um dos populares presente na sessão em Anobra, disse ter “mais pena das pessoas que vão viver ao lado da linha do que das que terão as casas a ir abaixo”.
A Assembleia Municipal de Condeixa vai reunir em sessão extraordinária na próxima terça-feira (11) para analisar o projecto, enquanto a Agência Portuguesa do Ambiente anunciou uma sessão pública de esclarecimento, no auditório do Instituto Português do Desporto e Juventude, na Rua Pedro Monteiro, 73, em Coimbra, no próximo dia 13, entre as 17h30 e as 20h30.
LUÍS CARLOS MELO
[NOTÍCIA DA EDIÇÃO IMPRESSA]
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