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Construção vive momentos inesperados

24 de Outubro 2022

O sector da construção vive momentos singulares, momentos totalmente incompreensíveis e inesperados, diria até impensáveis até há uns anos.

Apesar dos efeitos severos da pandemia na economia, o sector da construção mostrou a sua resiliência e conseguiu continuar a crescer, mas em 2022 este crescimento começou a mostrar sinais das restrições impostas e do impacto relacionado com a evolução dos preços dos produtos energéticos e das matérias-primas, especialmente das importadas.

Segundo a Associação dos Industriais da Construção Civil e Obras Públicas no 1º semestre de 2022 verificaram-se crescimentos de 1,7% no investimento em Construção e de 1,3% no VAB do sector da Construção, variações que evidenciam um abrandamento no ritmo de crescimento do sector, em relação aos mesmos indicadores em 2021.

Nos primeiros seis meses de 2022 é possível registar um aumento dos custos da construção da habitação superior a 12%, resultante do crescimento de 17% do índice relativo à componente de materiais e de 6,9% no índice relativo à componente da mão de obra enquanto o mercado das obras públicas evidencia uma redução no volume de concursos de empreitadas públicas.

Antes da pandemia e da Guerra na Ucrânia, não se falava da escassez de matéria-prima, do aumento do preço da energia, nem da dificuldade de entrega de determinados produtos por parte das fábricas. Antes da pandemia e, apesar de alguns sinais do setor, ninguém falava da dificuldade em se adquirir mão-de-obra qualificada.

E, apesar de se querer mascarar o tema da falta de mão de obra com a questão dos salários, a realidade é que esta dificuldade vai muito além da questão dos salários. O problema é que se expôs, ao longo do tempo, a imagem de um sector sujo com uma forte componente física e, apesar, de ser em grande parte verdade, a realidade é que este é também um sector assente num profundo conhecimento técnico.

A ausência de cursos profissionais na área da construção vem, precisamente, reforçar a descredibilização do conhecimento técnico nesta área, bem como, assumir uma posição de total desinteresse do nosso Governo na área da construção, mas, a realidade é que, mais uma vez, o sector público, necessita que a construção continue a alavancar a economia.

Portugal tem, com o Plano de Recuperação e Resiliência, um pacote financeiro arrojado que, também se apoia em investimentos no sector da construção em áreas como a habitação, a eficiência energética de edifícios e a construção de infra-estruturas, e dificilmente conseguirá materializar, atendendo à conjuntura actual. É inevitável a aposta na formação de activos qualificados para o sector e isso terá de ser feito o quanto antes, sob pena dos custos na construção se tornarem incomportáveis para todos.

Com a subida elevada dos preços dos materiais, o aumento da factura energética e a falta de mão de obra qualificada, o sector atravessará uma subida que dificilmente será acompanhada pelos particulares e pelo sector público, pois este também está condicionado ao Orçamento Público e ao financiamento comunitário.

Não existem dúvidas que o futuro da construção assentará mais numa óptica de reabilitação e manutenção de edifícios e espaços públicos e será cada vez mais um sector especializado e escasso dada a especificidade dos conhecimentos técnicos, que serão cada vez mais diminutos e, por isso, mais avultados. A construção de raiz terá de assentar numa óptica de construção circular que reduza o desperdício e impulsione uma maior produtividade de recursos endógenos, mas, até que esta mudança se opere, será cada vez mais uma tipologia diminuta e que apresentará valores elevados, só comportáveis por alguns estratos sociais da nossa sociedade. O futuro ditará também a dificuldade na aquisição de produtos específicos da construção, dadas as restrições energéticas e a subida dos preços dos combustíveis…estamos feitos num 8? Diria que sim, se não tivermos a capacidade de apostar numa mudança de paradigma no sector e não apostarmos na formação de recursos humanos como resposta às diferentes especialidades e se a conjuntura actual não alterar. Se os gastos energéticos com a produção dos produtos continuar a subir e se tivermos de continuar a importar os materiais, estes custos replicar-se-ão na solução construtiva aplicada e consequentemente no preço final ao consumidor e dificilmente, atendendo aos salários portugueses e ao aumento dos bens de primeira necessidade, as pessoas conseguirão acompanhar estes aumentos! Mas como a realidade que conhecíamos mudou em semanas, com o contexto da pandemia, quero acreditar que todo este cenário pessimista, poderá inverter-se com o fim da Guerra, com a regulação do mercado imobiliário e com a aplicação deste conceito de circularidade no sector…tenhamos nós esta capacidade de ser optimistas!

 

Célia Marques

Arquitecta e empresária

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