Pombalense nascido em Lisboa porque “a família da minha mãe era de lá, mas a família do meu pai era de Pombal há várias gerações”, cresceu na cidade do Marquês e cedo rumou à capital para continuar os estudos que, inicialmente, não foram em medicina.
“Iniciei a minha vida no Técnico em Lisboa. Entrei em engenharia química, mas acabei muito desiludido com o curso”, conta o médico João Coucelo.
Mudou de curso no final do seu primeiro ano no Técnico e acabou por escolher medicina, talvez porque o seu tio Jorge Ulisses “era um dos médicos mais antigos de Pombal e havia uma certa motivação para que eu seguisse o curso de medicina. Num acto de rebeldia, típico de quem tem os seus 16/17 anos, decidi que iria então para engenharia química porque gostava muito de experiências. Só que o curso de engenharia acabou por se tornar uma desilusão e aquilo que eu tanto contrariava, muito por rebeldia, acabou por se concretizar na minha opção”. E lá seguiu para medicina.
Dos seus tempos de estudante ficaram as memórias da época em que pertenceu à direcção da Associação de Estudantes, das lutas do pós-25 de Abril, “naquelas confusões, naquelas reuniões gerais de alunos muito participadas”, da altura em que foi atleta federado e jogador de râguebi.
A paixão pela política e o amor pela medicina
Escolheu o Alentejo, mais concretamente Mértola, como primeiro sítio para exercer a profissão que escolheu de coração.
“Eu e um grupo de colegas escolhemos Mértola, um concelho que ninguém queria e dos mais pobres deste país. Como tínhamos vontade de trabalhar e fomos em grupo, gostámos imenso de trabalhar lá. Foi lá que conheci a minha mulher e foi lá que casámos. Foi também para lá que fiz o serviço médico à periferia, que durou um ano e era obrigatório naquele tempo. Acabei por estar lá não um ano, mas 18 meses, porque assumi alguns cargos que me pediram para assumir, como a presidência da comissão instaladora do novo centro de saúde de Mértola e fui também subdelegado de saúde”, revelou ao TERRAS DE SICÓ.
Foi desafiado a ficar como clínico geral pelo presidente da Câmara só que acabou por recusar, apesar de ali ter “uma vida tranquila e de muito convívio” e de em termos profissionais também ter sido “muito feliz”. Porém, entendeu que queria tirar uma especialidade e que para isso teria de retomar à cidade.
“Na altura, a minha mulher, enfermeira, para sair do Alentejo, concorreu para Leiria e havia uma vaga para Pombal, que conseguiu ocupar. Na época não davam transferência dos meios rurais para as cidades, mas como foi um concurso público e ela ficou com uma das três vagas, acabou por escolher Pombal. Tudo isto coincidiu com a época em que me preparava para o exame de acesso à especialidade e como sabia que ela vinha para Pombal, juntei o útil ao agradável. Sabia que não iria ocupar a vaga que tanto queria em Lisboa, porque um colega teve melhor nota de acesso do que eu. Além disso, já tinha a minha filha mais velha e estava mais que na altura de continuarmos as nossas vidas lado a lado ao contrário dos tempos em que a minha mulher estava em Mértola e eu em Lisboa”.
Chegado a Pombal, ingressou no Hospital dos Covões, em Coimbra, “onde estive uma série de anos e fiz a minha especialidade”, passando também pelo Hospital Santo André, em Leiria, e pelo Hospital Distrital de Pombal.
Foi pouco depois do seu regresso a Pombal que o primeiro convite para ingressar na vida política da cidade surgiu.
“Quando vim para Pombal, depois de um ano de estar na cidade, pessoas que conhecia convidaram-me para apoiar o candidato do PSD na altura à Câmara Municipal contra o engenheiro Guilherme Santos, que era um presidente respeitado e admirado pelos pombalenses. Fui então candidato à Assembleia Municipal, entrei e mantive a minha ligação até aos dias de hoje”, conta o agora primeiro secretário da Assembleia Municipal.
Foi vereador em 1993, cargo que exerceu durante oito anos, passando pelos pelouros da saúde, da juventude, do desporto, dos tempos livres, “sempre sem remuneração e muitas vezes a sair da Câmara depois da meia-noite para no dia seguinte entrar as 8 horas da manhã no hospital”. E assim foi durante todos aqueles anos.
No decorrer da sua vida política, chamemos-lhe assim, nunca se voluntariou para qualquer cargo, antes pelo contrário, aceitou e recusou, e chegou a ser “desafiado” para se candidatar à presidência da Câmara Municipal de Pombal.
“Houve uma determinada altura em que fui pressionado para me candidatar. O ex-presidente Narciso Mota sempre me ‘pressionou’ e sempre lhe respondi: gosto da actividade política, mas não quero ser político, no sentido de ocupar um lugar destes abdicando da minha profissão e não posso ser presidente da Câmara e médico. Depois de tantos anos a estudar, de tanto investimento feito na minha formação, nunca me imaginei a abdicar da medicina pela política. Cheguei a meditar muitas vezes sobre o assunto, contudo, vinha-me sempre à cabeça de que seria um grande disparate”, confessou.
Terminadas as suas funções em Pombal regressou ao Hospital dos Covões, onde tinha lugar no quadro, para desempenhar funções como médico do serviço de medicina e chefe de equipa da urgência. Até chegar a 2005, altura em que foi convidado a assumir o cargo de director clínico do Centro Hospitalar de Coimbra, que juntava o Hospital dos Covões, a Maternidade Daniel de Matos e o Hospital Pediátrico, e de onde saiu “em combinação com os meus colegas. Regressei a Pombal porque já me faltavam poucos anos para me reformar e sempre gostei do meu trabalho aqui, em hospitais mais pequenos”.
Desengane-se quem pensa que o seu ritmo de trabalho abrandou nos seus últimos de carreira hospitalar. Em 2011, época em que a ‘troika’ surge em Portugal, Pombal foi integrado no Hospital Santo André e o dr. João Coucelo foi convidado a assumir a direcção clínica daquele hospital.
“Foram tempos muito difíceis os da ‘troika’. Todos sofremos com isso, mas a nível dos hospitais tivemos cortes de financiamento bastante significativos e fomos obrigados a sobreviver com isso durante três anos. Os hospitais conseguiram resistir a esta falta de financiamento, que na verdade já era crónica, mas que se agravou nesta época”.
Leiria estava numa fase de transformação. “O Santo André foi um hospital que cresceu muito, mas que apanhou o embate do subfinanciamento pelo facto de haver intervenção externa e não conseguia, para as áreas que nós pretendíamos todos desenvolver, obter os recursos humanos que vimos muito asfixiados durante aqueles anos. Então a determinada altura achei que não tinha condições para continuar e pedi a demissão, até porque entendia que se não conseguia fazer o meu melhor, era preferível sair”.
Depois do trabalho feito, o que fica?
Regressou a Pombal onde manteve a sua actividade no hospital até à aposentação. Hoje mantém-se profissionalmente activo no sector privado, o que lhe dá alguma liberdade para assumir novos desafios como liderar as comemorações do centenário do Sporting Clube de Pombal (SCP).
“Sou sócio do Sporting [de Pombal] há cerca de 25 anos. Nem sequer era uma pessoa que ia frequentemente ao futebol. Só que quando me convidaram senti que tinha alguma obrigação de dar o meu contributo, porque curiosamente na minha família, o meu tio-avô Telémaco foi o primeiro director do Sporting e também o primeiro guarda-redes. O meu pai também teve cargos de direcção no clube ao longo dos anos. Portanto, existia esta ligação familiar e entendi perante um convite que me tinham feito que, tendo até algum tempo disponível, não poderia dizer que não” ao desafio para presidir à comissão organizadora do Centenário do SCP.
Quanto ao trabalho feito, garante que fez tudo o que lhe competia fazer. No entanto, em relação ao Hospital de Pombal havia melhorias devidamente projectadas, e até mesmo aprovadas, que não chegaram a sair do papel porque o governo mudou.
“Havia planos discutidos até às últimas consequências para uma ampliação do hospital, que hoje seria extremamente útil. Queríamos a criação de um novo grande bloco, uma área muito generosa para a medicina de reabilitação, gabinetes de consulta para a pediatria e para a ecografia, uma área dedicada às consultas cirúrgicas e outra às consultas médicas. Tudo isto num edifício que seria de rés-do-chão, 1.º e 2.º andar, que foi aprovado pela Direcção Regional de Saúde e pelo secretário de Estado da Saúde, mas como mudou o governo foi colocado na gaveta”, lamentou o médico.
E esta é uma mágoa que guarda até hoje o médico a tempo inteiro, político em ‘part-time’, porque sempre assim o quis.
RUTE AZEVEDO SANTOS
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