16 de Maio de 2025 | Quinzenário Regional | Diário Online
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PAULO JÚLIO

Inventar a roda

16 de Julho 2021

Sabemos que tudo tem um custo e quando se trata de um custo do Estado, isso significa mais um qualquer imposto ou taxa. Imposto sobre o consumo, sobre os rendimentos das pessoas e das empresas, sobre o património, sobre os combustíveis, sobre os automóveis, sobre transacções de imóveis, entre outros e outras que suportam as receitas do Estado.

Cada uma dessas receitas serve para pagar um determinado serviço que sendo público é para todos os portugueses, sem excepção e em nome da Constituição. Existem ainda, as rendas em diversos sectores quase sempre protegidos. Uma dessas rendas que os portugueses pagam aos concessionários, quando percorrem as estradas portuguesas, tem um impacto especial no desenvolvimento dos territórios e na mobilidade intra-regional. Refiro-me às portagens das estradas que, no caso dos territórios mais distantes dos centros urbanos de Coimbra, Leiria, Castelo Branco e Guarda – para só falar na região Centro – prejudicam a mobilidade das pessoas e não evitam a carga excessiva diária de trânsito nas velhas estradas nacionais que passam no meio de aldeias, colocando em constante perigo, a vida de pessoas.

Se fizermos um “zoom” a esta problemática no nosso território, a auto-estrada A13 construída para supostamente criar uma alternativa ao velho IC3 entre Condeixa e Tomar, é uma daquelas aberrações que não fazem sentido. A A13 é uma estrada que rasga o Pinhal Interior e que tem como objectivo principal “aproximar” concelhos que não têm pessoas, têm indicadores de desenvolvimento mais débeis, e, por consequência, pouca massa crítica, para acompanharem as exigências colectivas existentes. Recordo-me bem que os concelhos de Miranda do Corvo, Lousã, Poiares, Penela, Ansião, Pedrogão Grande, Castanheira de Pêra, Figueiró dos Vinhos, Ansião , Alvaiázere e Ferreira do Zêzere esperaram dezenas de anos por uma estrada alternativa que melhor os ligasse às cidades mais próximas, aos hospitais centrais, em caso de emergência, às universidades e escolas secundárias,  e, assim,  proporcionasse maior esperança e maior qualidade de vida às pessoas, no que respeita a oportunidades de desenvolvimento.

Lembro-me bem que na altura em que se discutiu o perfil dessa estrada alternativa, todos defendemos que não tinha de ser uma auto-estrada e lembro-me que o Governo de então, apresentava essa solução como inevitável, uma vez que o modelo de construção teria de ser uma parceria público-privada, portanto, sem investimento imediato do Estado. Lembro-me bem de termos discutido os custos das portagens e da necessidade de proteger quem vivesse nesses concelhos ou quem lá trabalhasse – pessoas e empresas desses concelhos deveriam ser discriminadas positivamente, estimulando mobilidade e dando vantagem a territórios que foram deixados para trás pelo Estado, seja por efeito do seu centralismo, seja por efeito da erosão da história e da ruralidade imposta por um século XX de miséria que empurrou muitas dezenas de milhares de pessoas para a emigração para vários países da Europa e da América, principalmente, ou para a Área Metropolitana de Lisboa, à procura de sobrevivência e fugindo da quase garantida miséria geracional.

Também me lembro bem, há cerca de quatro anos, no epílogo da tragédia dos incêndios de Pedrogão e Castanheira de Pêra, que o “País” se levantou em defesa destes “territórios indefesos” e votados ao “ostracismo”. Foi ver um corrupio de governantes a tentar “apagar o fogo social” que a tragédia tinha deixado. Foi ver os mesmos do costume a convidar meia-dúzia de eminências pardas para “traçarem” um plano estratégico de desenvolvimento para “este interior” ferido de morte por incêndios que (só) vieram expor aquilo que muitos já sabiam, muitos já tinham falado milhares de vezes, em cerimónias formais e nos corredores de quem poderia decidir.

Mas, claro que, à boa maneira portuguesa, era preciso começar tudo de novo e “fazer a discussão”, desde o início, com umas pessoas notáveis para dar “mais credibilidade à coisa”, nem que fosse para “inventar a roda”. Este provincianismo mata territórios, com o beneplácito ou com a falta de “voz política” dos locais. Sabemos que vem para aí um plano, não sei se mágico, se eficiente, mas quero acreditar que não seja para fazer mais umas obras públicas que (já) não sirvam para nada, que não mudem o que é preciso mudar num território que não tem gente sequer para ser contratada pelas empresas que desde aqui operam. Gente. Pessoas. É isso que é preciso aqui. Mas, que só se fixarão, com um território cuidado, com um território valorizado, com um território próximo dos centros urbanos polarizadores.

Voltando ao custo das portagens, por falar nisso, de uma estrada que não é mais utilizada porque é muito cara. Essa seria uma medida simples com resultado imediato e que associada a políticas de desenvolvimento habitacional (isto não é Coimbra onde os investidores não se inibem e onde sempre rentabilizam os seus investimentos!) possam atrair pessoas. O mote é atrair pessoas. Quem diz “outras coisas” não sabe nada do que aqui se passa, apesar de poder ser, eventualmente, muito conhecido. Pessoas. Menores custos de portagens na A13. Políticas de desenvolvimento de habitação. Foco das autarquias da região nestes eixos estratégicos. Se, neste seguimento, cuidarem do património histórico e natural que possuem, diria que já vão fazer muita diferença. Ah!… E não basta ter uns programas ou umas deliberações, é preciso trabalhar empenhadamente para se obterem resultados.


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