Foram os muitos documentários sobre “estrelas, pulsares, buracos negros, sistemas solares, teorias de como surgiu a vida no planeta Terra ou até sobre astronautas” que viu em miúdo na televisão e que lhe aguçaram o interesse pelo espaço.
“Isto acabou por criar um bichinho dentro de mim por serem coisas tão diferentes daquelas com que lidamos diariamente, que arrisco-me a dizer que foi o que me deu esta motivação para eu desenvolver trabalho relacionado com o espaço”, recordou José Silva, também conhecido por Zé Rui, ao TERRAS DE SICÓ.
O jovem ansianense que, guarda na memória a infância e adolescência vivida entre Sarzedela e Ansião, vive agora o sonho e desejo de “ajudar a Humanidade a desenvolver coisas para o espaço”. Foi na Holanda, onde agora se encontra, que percebeu “melhor o que é que eu queria na minha vida”, levando-o a integrar o projecto Gusto.
“Quando concorri à minha tese de mestrado já sabia que estaria relacionada com o projecto. Na altura estavam a apresentar a proposta para a missão e procuravam financiamento. A minha tese teve já uma participação nessa proposta porque eu estudei alguns sensores que podiam ser, e foram, utilizados na missão. Eu já estava envolvido na missão e queria continuar a trabalhar aqui mas, na altura, estava tudo muito incerto porque ainda não tinha havido uma aprovação. Na época, o investigador com quem eu trabalhava mais directamente recebeu uma proposta para ir trabalhar para a NASA [agência espacial norte-americana] e criou-se ali um vácuo no laboratório. Apesar da minha inexperiência, eu acabava por ser uma das pessoas mais bem qualificadas para assumir a sua posição porque estava por dentro do projecto desde o seu início”, conta-nos o engenheiro de micro e nanotecnologia.
O projecto Gusto, aprovado em 2017 e financiado pela NASA, trata-se de um telescópio que irá voar num balão estratosférico a 40 km de altitude durante três meses e está a ser desenvolvido no Instituto Espacial Holandês (SRON Netherlands Institute for Space Research) pela equipa integrada por Zé Rui, para, no final deste ano, ser lançado na Antártica.
“O objectivo do telescópio é estudar zonas de formação de estrelas que existem no universo para, a partir dessa informação, criar modelos que nos permitam estudar outras galáxias, dado que actualmente estamos a estudar apenas a nossa. Esta informação vai ajudar-nos a perceber como é que os sistemas solares se formam, digamos que é uma fase inicial que nos permitirá depois descobrir como é que a vida, no final deste processo, acaba por surgir”, explica José Silva.
Câmaras telescópicas
O trabalho deste engenheiro passa pelo desenvolvimento das câmaras instaladas no telescópio e que possuem “uma tecnologia baseada em sensores de nano tecnologia semelhantes a uma folha de papel mas um milhão de vezes mais pequena e que é muito sensível a um tipo de radiação designada infravermelha afastada”, sendo que outra das vantagens desta tecnologia desenvolvida para o projecto é que funciona de forma semelhante a um rádio onde “temos dois sinais: um sinal do universo e outro controlado por nós, e este segundo sinal permite-nos escolher a estação, ou seja, permite-nos escolher qual é tom da luz que queremos ver, e as nossas câmaras o que fazem é ver esse tom de luz e todas as variações muito pequeninas à volta desse tom de luz”.
“A missão Gusto tem duas características muito interessantes. A primeira delas é que se trata de um balão estratosférico que, normalmente, tem uma duração de um dia a duas semanas, mas o Gusto é uma missão-piloto em que se tenta demonstrar se é possível voar durante três meses e caso seja possível vai permitir construir prototipagem de satélites para enviar com muito menos riscos, muito menos custos e onde se pode já obter alguma ciência. A segunda novidade tem mais a ver com a tecnologia em si, já que as câmaras que vamos usar nesta missão-piloto são as mais poderosas de sempre por terem oito pixéis quando as utilizadas em missões anteriores tinham apenas um ou seis pixéis no máximo. Em três meses vamos conseguir obter tanta ciência como na missão espacial Herschel que durou dois anos a partir do espaço, ou seja, apesar das nossas limitações com a atmosfera conseguimos obter a mesma ciência em três meses comparativamente àquela missão que durou dois anos, daí o salto tecnológico desta missão”, esclarece.
Futuro não passa por cá
Quanto ao seu futuro, mostra-se aberto a possibilidades, referindo que trabalhar directamente com a NASA “seria um sonho”, mas que existem outras possibilidades como a Space X [empresa norte-americana de sistemas aeroespaciais e de serviços de transporte espacial] que seriam “um desafio igualmente interessante”. Portugal é também uma hipótese para o jovem ansianense, porém, admite que “talvez só aconteça daqui a algumas décadas, a não ser que algo mude entretanto e surgisse uma forte oportunidade que me fizesse regressar ao meu país”.
[NOTÍCIA DA EDIÇÃO IMPRESSA]
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