Foi a partir de 25 de Maio de 2020, logo após o primeiro confinamento, que as habituais feiras semanais voltaram à rua na cidade de Pombal. Mas há semelhança de outros espaços comerciais, também os feirantes sentiram os efeitos nefastos da pandemia.
“As pessoas não vêm à feira, têm medo. Acham que aqui ficam contaminadas mas depois encontramo-las em centros comerciais, um espaço que é completamente fechado, à porta de lojas, em filas onde não se respeitam regras de distanciamento mas só na feira é que anda o vírus”, diz Susete Gonçalves, feirante em Pombal, em tom de ironia.
Em meados do mês, fomos à feira, quando já “cheirava” a novo confinamento, com o crescente número de casos de contágio de covid-19. O recinto que outrora se encontrava cheio de feirantes e clientes, estava agora repleto de espaços vazios que denunciam o abandono que estes vendedores sentem.
“Sempre acreditei que a feira não acabava, que isto nunca chegaria ao fim porque é uma representação da tradição mas agora estou convencido que sim, este vírus mostrou-me isso”, contou Vítor Cardoso, feirante de calçado, ao TERRAS DE SICÓ.
A ausência de clientes não é novidade para estes vendedores que dizem sofrer de um “preconceito constante apenas porque vendemos na feira e acham que os nossos produtos são de fraca qualidade, quando na verdade trabalhamos com marcas portuguesas”, refere Susete Gonçalves.
As restrições impostas aos emigrantes aquando a sua chegada a Portugal levaram a que os meses de Verão fossem também eles um fracasso de vendas.
“Nós vivemos um bocado para os emigrantes, porque a maioria das pessoas que cá estão o ano todo não vêm à feira. Só que este ano nem isso tivemos. As restrições impostas pelo Governo levaram a que muitos deles não viessem cá e isso reflectiu-se nas vendas”, desabafou Vítor Cardoso.
Além do “preconceito” que existe desde que se lembram, estes feirantes frisam a falta de apoio por parte do Governo e da autarquia.
“Não temos apoio de nada, nem ninguém. Aqui em Pombal temos os fiscais à entrada porque nos têm de assinar o papel do terrado, mas a nível de controlo estamos por nossa conta e risco. Entras com máscara porque assim o queres, não existe policiamento, não existe desinfectante às entradas, nada!”, conta Susete Gonçalves.
Apesar de os apoios serem “inexistentes”, Susete Gonçalves e o marido, José Gonçalves, continuaram a marcar presença na feira e a pagar as habituais contribuições camarárias.
“Sabemos que é da nossa obrigação pagar o valor do terrado e a Câmara isentou-nos de pagamento naqueles meses de confinamento, mas podia ajudar-nos mais um bocadinho. Em Leiria foi suspenso o pagamento dos terrados, até ao momento não estamos a pagar nada, e lá há policiamento, seguranças na entrada e ninguém entra sem desinfectar as mãos, aqui não. O Município de Pombal não está a ter qualquer despesa connosco”, referiu Susete Gonçalves.
Para Maria José Santos, outra feirante habitual da cidade, as ajudas existiram mas “muito no início, quando estivemos todos em casa e não nos cobraram durantes aqueles meses o valor do terrado”, mas aquando do regresso à feira “não houve mais nada por parte da Câmara, nem em questão de dispensa de pagamento, nem em material de protecção para os feirantes ou clientes”, referindo que ali cada vendedor tem “o seu álcool gel à disposição do cliente”.
As recomendações da Direcção-Geral da Saúde (DGS) para a reabertura das feiras e mercados de levante foram claras: o uso de máscara, a higienização das mãos, o tempo de permanência no espaço restrito a uma hora e o controlo das entradas e saídas dos recintos.
Tudo isto aconteceu aquando a abertura das feiras mas não era a realidade com que lidavam até há dias. O álcool gel nas entradas era inexistente, o período de permanência estava à vontade de cada um, nas entradas e saídas não existia fiscalização e a utilização da máscara ficava à mercê de cada qual, afirmam.
O descaso que estes vendedores diziam sentir na ausência de manutenção e segurança do espaço gerou revolta de cada vez que ouviam por parte das entidades, quando o número de casos covid-19 aumentava, que as feiras e mercados não se podiam realizar.
“Aqui estamos a céu aberto, estamos afastados uns dos outros, não há concentração de pessoas e mesmo assim querem-nos proibir de vir trabalhar. Porquê se o que vemos nos centros comerciais são enormes filas e concentração de pessoas? Não somos contra as lojas, todos precisamos de trabalhar, mas porque é que só nós é que somos prejudicados?”, desabafou na altura José Gonçalves, sob a constante indecisão do Governo em manter feiras e mercados abertos.
Contudo, em espaço de pouco tempo, o cenário outrora pouco animador é agora desolador. O novo confinamento levou a que estes comerciantes voltassem a casa sem uma data prevista para o regresso. Muitos deles não tencionam voltar, já outros temem não ter mais forças para retornar.
[NOTÍCIA DA EDIÇÃO IMPRESSA]
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