O Tribunal de Leiria extraiu certidões a 22 dos 79 arguidos do processo de venda de sapatilhas contrafeitas, por não ter conseguido notificá-los, decidiu ontem a juiz presidente do colectivo, na primeira sessão de julgamento. Os arguidos são residentes em várias localidades dos distritos de Leiria e Santarém, entre as quais Pombal e Meirinhas.
Começou hoje no Tribunal de Leiria o julgamento de 79 arguidos, entre os quais dois funcionários dos CTT, suspeitos de burla qualificada, corrupção activa e passiva e associação criminosa num esquema de venda de sapatilhas ‘online’.
Compareceram apenas 49 arguidos.
Dos acusados presentes, duas arguidas admitiram inicialmente prestar declarações, mas, à tarde, declararam terem “mudado de ideias” e remeteram-se ao silêncio, tal como os restantes arguidos.
O julgamento ficou marcado essencialmente por questões processuais. Além da identificação dos arguidos, a procuradora do Ministério Público dispensou 30 das mais de mil testemunhas no processo, que tem sessões agendadas até maio.
Vários arguidos pediram também dispensa da sua presença nas sessões de julgamento – agendadas quatro dias por semana –, a maioria justificando que se encontra a trabalhar.
O início da sessão matinal ficou ainda marcado pelo requerimento de um dos advogados, subscrito por todos os defensores presentes.
Mapril Bernardes pediu suspensão dos trabalhos naquela sala, alegando “não haver condições condignas”.
“Como puderam constatar, a sala não tem o mínimo de condições para que os advogados trabalhem com dignidade. O tribunal entende que dar uma mesa com 55 centímetros de largura e 45 de profundidade permite aos advogados desempenharem cabalmente as suas funções. Não é possível”, explicou aos jornalistas à saída do tribunal.
O advogado, que comparou o espaço a uma “mesinha de cabeceira”, adiantou que não consegue ter o computador e o bloco de notas abertos ao mesmo tempo.
“Há aqui uma total falta de consideração pelos advogados que o tribunal não reconheceu. Entende que estão reunidas as condições mínimas e indeferiu o meu requerimento.”
A Comarca de Leiria realizou obras de adaptação para a sala receber este julgamento. “Decidiu-se gastar esse dinheiro, agora têm de o justificar, mas isso à custa da falta de condições para os advogados trabalharem”.
Segundo o despacho de acusação a que a agência Lusa teve acesso, os arguidos estão acusados por burla qualificada, corrupção activa e passiva, branqueamento de capitais, falsificação de documentos, venda e circulação ou ocultação de produtos e artigos e associação criminosa.
Inicialmente, estavam acusadas 82 pessoas, entre as quais outras duas funcionárias dos CTT e a namorada de um dos suspeitos.
No entanto, no debate instrutório pedido por alguns arguidos, o juiz de instrução Carlos Alexandre decidiu não pronunciar as três mulheres por não existirem indícios suficientemente fortes da prática de qualquer crime nos seus casos.
O MP refere que, no início de 2014, dois arguidos criaram páginas em várias redes sociais em que promoviam e anunciavam a venda de ténis das mais diversas marcas, a preço de saldo e/ou ‘outlet’, afirmando ser calçado importado e de colecções mais antigas e, por isso, mais barato do que nas lojas originais das marcas.
Como o volume de encomendas começou a aumentar, juntaram-se aos outros arguidos para fazer face às encomendas.
As tarefas, que os arguidos terão realizado em conjugação de esforços, combinados entre si segundo uma estrutura organizada com atribuições definidas, incluíam adquirir bens, armazenar produtos, tratar das encomendas, publicitar/difundir bens nas páginas da internet, contactar os possíveis clientes, embalar produtos, criar apartados postais e levantar vales postais em locais circundantes da sua zona de residência, nomeadamente em Alcobaça, Amor, Batalha, Leiria, Marrazes, Marinha Grande, Maceira, Monte Real, Monte Redondo, Meirinhas, Pombal e Porto de Mós, no distrito de Leiria, e Minde e Ourém, no distrito de Santarém.
No entanto, tendo em conta que o volume das encomendas passou a “mais de 500 por dia”, os arguidos “deixaram de conseguir cumprir com o envio de réplicas dos ténis e combinaram entre si enviar qualquer coisa, passando então a enviar ténis de marca branca, chinelos e outros objectos que nada tinham sequer a ver com as encomendas efectuadas”.
Segundo o MP, depois de os ofendidos contactarem os arguidos através das redes sociais para adquirirem os produtos, o pagamento seria através de cobrança postal.
As encomendas eram sempre remetidas dentro de caixas de ténis para que, quando recebidas, os lesados pensassem conter os ténis que tinham encomendado, pagassem e só depois se apercebessem do conteúdo.
O MP acusa dois funcionários dos CTT, que considera que facilitavam a abertura e a movimentação dos apartados postais, e “recebiam uma parte do valor dos vales”.
O levantamento das quantias pagas era depois entregue ao principal líder para fossem levadas para Marrocos no seu automóvel.
Com este esquema, foi criado um prejuízo patrimonial às vítimas superior a três milhões de euros.
O processo tem mais de mil páginas e mais de mil testemunhas.
Doze arguidos estão em prisão preventiva e três com obrigação de permanência na habitação.
A próxima sessão realiza-se dia 11, pelas 9h15.
LUSA
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