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Penela: Legacão luta contra despovoamento total

9 de Novembro 2019

A pequena aldeia de Legacão, nas franjas do Rabaçal, tenta resistir ao despovoamento total de que não faltam exemplos não só no concelho de Penela mas um pouco por toda a região.

Por ali estão habitadas três casas, por entre mais meia dúzia delas, a maioria em avançado estado de degradação. A povoação é ocupada diariamente por quatro pessoas, esporadicamente meia-dúzia, porque um casal nortenho, apreciador do cenário bucólico do local, no sopé de frondosas penhas, não deixa de passar mensalmente um período de tempo na casa que possui em Legacão, e não Legação, como os “googles” destes tempos modernos se encarregaram de a rebaptizar.

Do centro da terra do afamado queijo a Legacão a distância não são mais de dois quilómetros, mas são os últimos mil metros que não são aconselháveis nem com tempo seco, nem chuvoso. Um estradão em brita, por entre olivais e outros terrenos agrícolas, alguns deitados ao abandono, deixa “muito pó no Verão e lama no Inverno”, reclama Valentim Nunes, um agora ex-emigrante apostado em trazer gente à terra. Já lá vamos.

O alargamento da via fez-se há muito, mas nunca viu asfalto. “Isto é um absurdo. Está assim há perto de 20 anos, não é possível, é uma grande vergonha”, afirma quem percorre aquele quilómetro todos os dias.

“Não consigo entender os critérios desta gente: onde passam tractores alcatroa-se e onde passam pessoas não”, refere.

Ao TERRAS DE SICÓ o presidente da Câmara de Penela diz não estar prevista qualquer intervenção para o local. “A estrada apesar de não estar asfaltada tem boas condições”, assegura Luís Matias.

 

Turismo rural

Como já referimos, em Legacão as casas são poucas e as pessoas ainda menos. E menos ficaram quando há meia dúzia de anos fechou uma unidade de fabrico de queijo Rabaçal, cujas instalações procuram agora novo dono, decerto para uma finalidade distinta, “por exemplo, um hostel”, sugere Valentim Nunes, que serviu de cicerone à reportagem do TERRAS DE SICÓ.

Aos lamentos pelo estado da única via de acesso, o ex-emigrante junta o penoso cenário proporcionado por várias casas antigas degradadas, umas já em ruínas e outras a caminho. “Está tudo abandonado, as pessoas vêem isto e fogem”, comenta com a tristeza estampada no rosto.

Valentim Nunes tem 68 anos. Andou emigrado pela Austrália, pelas Américas e por Inglaterra. Trabalhou na área dos transportes de mercadorias. Por entre as idas e os regressos, Legacão foi sempre o chão luso que pisou. Seu pai fora ali caseiro e os terrenos em que outrora labutou estão agora a ser comprados pelo filho. Apesar das queixas, na desertificada aldeia quer pôr em marcha algo próximo de um “turismo rural”, que atraia gente a um “autêntico refúgio da natureza, a um mini tesouro abandonado”.

Com escassos apoios para levar a ideia adiante, estaremos na fronteira entre o sonho e o devaneio? Nada disso. Valentim garante que o projecto vai ser uma realidade no prazo de quatro, cinco anos. Na mente tem bem presente o que pretende para cada um dos espaços rurais que foi adquirindo na zona sobranceira à povoação. O que lhe falta em meios financeiros sobra-lhe em ambição e em vontade de levar pessoas à, e para a, aldeia. “Quero puxar gente para aqui”, afirma determinado.

Lá bem no alto da encosta, onde as fragas contemplam “um lugar fascinante mas que é pena estar como está”, a vegetação esconde “uma gruta com mais de uma centena de metros”. A “grota”, como lhe chama(m), pode também constituir um factor de atracção para amantes da espeleologia e do turismo de natureza.

O sol outonal brilhava na tarde em que o TERRAS DE SICÓ visitou Legacão. Na aldeia reinava somente o silêncio… e o inquieto Valentim, “um homem do mundo” inconformado com o estado da sua terra. Os outros três residentes estariam para mais um dia de trabalho. Por ali, nem o latir de um canino ou a fuga apressada de um qualquer gato. Nada. Apenas a tentativa de resistir a um desfecho que parece anunciado.

LUÍS CARLOS MELO


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