Um pão-de-ló não é mais que a mistura de farinha, ovos e açúcar. Fazer um pão-de-ló requer habilidade e saber. Embora qualquer pessoa saiba fazer um destes bolos, nem sempre fica um pão-de-ló à maneira.
Há que misturar carinho, amor e delicadeza.
O pão-de-ló tem que ser fofo por dentro, torradinho por cima e crocante nos lados.
Todos sabemos fazer um pão-de-ló?
Se calhar não! O meu marido, depois de aposentado resolveu dedicar-se a fazer pão-de-ló, que o faz tão bom, mas tão bom, que com uma chaveninha de café é um óptimo lanche.
Ele, na tropa, em missão em Moçambique, e no mato, fazia um pão-de-ló para os soldados comerem. Chamavam-lhe Totobolo. O mais curioso é que como não havendo forno, coziam-no no ninho abandonado das formigas. Lá pelos anos de setenta.
Sentada em frente à lareira com aquele calorzinho que nos enche o coração, uma fatia de pão-de-ló numa mão e um “ peniquinho” de café na outra mão. A chuva na rua, o vento que sopra e nós consolados em frente àquele calorzinho, sentados e refastelados no sofá. Há lá coisa melhor?
Também é boa uma fatia deste bolo barrado com uma colherada de doce, manteiga ou mesmo uma fatia de presunto.
À hora de me deitar, à noite, um bocadinho de pão-de-ló, faz-me sonhar e até dormir melhor.
As variantes são muitas: Alfeizerão com o interior em creme, porque estando no forno a cozer e com a visita do rei, na época em que os reis passeavam em carruagens puxadas por cavalos, quando os conventos estavam habitados por freiras trabalhadoras e gulosas. Elas ouviram o povo a gritar que vinha lá o rei, correram a tirar do forno como estavam. Mal cozidos. Mas como tinham na sua confecção muitos ovos e muito açúcar, parece que aprovaram. Ficaram bons. Hoje são conhecidos como tradicionais de Alfeizerão. Só se fabrica ali mesmo.
Recuando na memória dou por mim a ver uma tia solteira, mas já com alguma idade, fazer pão-de-ló.
Fazia no fogão de lenha. Não havia mais nada. Ou este fogão que nem toda a gente tinha, ou o da broa. Este só se acendia quando se cozia a broa. Mas também nem toda a gente tinha a sensibilidade necessária para cozer um bolo.
A minha tia Laura era uma mulher que sabia tocar piano, dizem que muito mal, dava injecções. Se mal injectadas nunca ninguém morreu disso. Nesse tempo sem centros de saúde ou enfermeiras eram as pessoas curiosas que faziam alguns tratamentos. Lembro-me do Sr. Artur que com tuberculose ia todos os dias levar a injecção. Assim viveu alguns anos.
Mas voltando ao pão-de-ló da minha tia. Iam as mulheres pedir que esta lhes fizesse um pão-de-ló. Levavam a farinha, os ovos e o açúcar.
A minha tia nem sempre atenta só se apercebia quando do forno saía fumo negro. Cheiro a queimado. E agora? Ela pegava em farinha, ovos e açúcar e fazia outro.
Nós comíamos o torrado.
Quantas vezes esse mesmo bolo, agora sem estar torrado, ficava em casa da minha tia como pagamento das injecções ou de outro qualquer favor.
-Menina Laurinha, é para si.
E lá tínhamos outro bolo.
Nunca mais me saiu da boca o sabor daqueles bolos. A forma era barrada com azeite. Não havia manteiga nem dinheiro para a comprar. Não havendo manteiga, usava-se azeite, quantas vezes acabado de fazer no lagar, também nosso.
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