Começou professor, virou político e agora é a escrita que o preenche. Eis Belmiro Moita da Costa, docente universitário aposentado, antigo presidente da Câmara Municipal de Condeixa e autor já de vários livros, técnicos e não só.
Cresceu na aldeia, formou-se na capital, deu aulas na coimbrã cidade universitária e não conseguiu resistir ao “bichinho” da política, que o afastou de um doutoramento desejado.
Aproximava-se o Natal de 1946 quando nasceu, a 21 de Dezembro, na pequena aldeia de Arrifana, próxima da sede do concelho que quase quatro décadas depois haveria de liderar.
Filho de pai agricultor e mãe doméstica teve uma infância “muito alegre e satisfeita”, embora com as dificuldades inerentes a qualquer miúdo que nasce numa aldeia onde há várias limitações, “também culturais, de conhecimento”.
“Tive a sorte de apanhar as chamadas bibliotecas itinerantes da [Fundação Calouste] Gulbenkian, onde apareciam os livros que comecei a ler muito cedo”, conta ao TERRAS DE SICÓ. De Júlio Dinis a Eça de Queiroz, de Camilo Castelo Branco a Raúl Brandão, eram uns atrás de outros.
Os estudos superiores concretizou-os em Lisboa, onde se licenciou em Finanças pela Universidade Técnica e onde teve os “primeiros entusiasmos” sobre a “coisa” política. Porém, nada de transcendente.
Já casado, a tropa surge na vida de Belmiro. Foi por pouco, mas não escapou a ser mobilizado para o Ultramar. Destino: Angola. Haveria de ser ali (quem diria…) que o então jovem alferes-miliciano se começou a interessar pelas questões políticas, “a ter as primeiras ideias sobre o que era a política no sentido teórico e pragmático, como funcionava o mecanismo dos partidos”.
As longas e persistentes conversas com três militares superiores que integravam o seu batalhão revelaram-se decisivas para o percurso de vida. “Eram homens com grandes conhecimentos teóricos e muito pragmáticos. Motivaram-me a ler três livros específicos, que devorei num instante. Depois comecei a ler tudo sobre política, mas pensando apenas do ponto de vista intelectual e não em ser um homem de acção”, salienta. O homem de acção, de facto, chegaria uns anos mais tarde.
De regresso a Portugal, poucos dias antes do 25 de Abril de 1974, torna-se professor do ensino secundário em Pombal, onde leccionou Estatística e Contabilidade durante cerca de dois anos, antes de ingressar no Instituto Comercial de Coimbra. Achava-se com jeito para a docência e com capacidade para ser um bom professor.
Enfim, a política
Em 1977, surge a possibilidade de dar aulas na Faculdade de Economia de Coimbra, por onde andaria até 2008. É também por aquela altura que a política se começa a intrometer no seu caminho.
“As primeiras eleições autárquicas ocorrem em 1976 e foram convidar-me à Arrifana, e não foi o PS, para fazer parte de uma lista para a Câmara Municipal [de Condeixa]. Disse que não, porque o meu objectivo era fazer o doutoramento e ainda comecei a trabalhar nesse sentido”, revela o “dr. Moita”, apelido pelo qual passou uma vida a ser tratado.
Resistiu ao primeiro convite, mas não ao segundo. Pouco tempo depois. Aí já de socialistas, entre eles o então presidente da Câmara, Armando Martins Tavares. O desafio era para integrar a lista à Assembleia Municipal nas eleições de 1979, a que anuiu, figurando, como independente, em segundo lugar. Eleito a 16 de Dezembro daquele ano, estava dado o primeiro passo de uma longa carreira política que o levaria a presidente de Câmara e a deputado da Nação.
Apesar desta incursão a docência continuava. Todavia, no início da década de 1980 concorre para o IFADAP – Instituto Financeiro de Apoio ao Desenvolvimento da Agricultura e Pescas, e entra como chefe de divisão. “O doutoramento começa a ficar mais longe”.
Nas eleições autárquicas de 1982, aceita o convite socialista, partido do qual já era entretanto militante, para ser o número 2 da lista liderada por Armando Tavares. Entra como vereador, mas de permeio, corria 1984 e o tempo do chamado “Bloco Central”, chega a deputado da Assembleia da República, cargo que ocupa durante pouco mais de um ano.
“Foi das coisas que gostei bastante na política. Tínhamos ali a elite do pensamento económico, jurídico e financeiro. Sem menosprezar alguém e dizer que ontem era melhor que hoje ou vice-versa, eram pessoas com mais experiência, intelectuais de primeira qualidade, de primeira água”, realça.
Ainda deputado é convidado a encabeçar a lista do PS à Câmara de Condeixa no sufrágio de 1985. Convite aceite, eleição assegurada para algo que “nunca esteve no meu horizonte”, projecta concretizar “o abastecimento de água a todo o concelho, desenvolver ao máximo a zona industrial, recuperar o Palácio dos Figueiredos para Paços do Concelho, construir o Palácio da Justiça e um edifício digno para o ensino secundário”. “Eram grandes objectivos, mas tinha a noção que sem isto Condeixa não teria grande progresso”, frisa.
Uns concretizou, outros deixou “bem encaminhados”, mas em 1993 decidiu não se recandidatar a um terceiro mandato. “Apanhei os governos de Cavaco Silva que prejudicaram o concelho de Condeixa e outros socialistas nos apoios aos municípios, e isso saturou-me muito e levou-me a não avançar”, revela, salientando contudo a “nova vivência” que o cargo lhe permitiu, através de um “relacionamento com todos, fosse qual fosse a sua origem ou posição social”.
Belmiro Moita da Costa volta então à Assembleia Municipal, como presidente, entre 1993 e 2009, chega a ser sondado para secretário de Estado num dos governos de António Guterres, e em 1996 é convidado para vice-presidente do CEFA – Centro de Estudos e Formação Autárquica. Regressa também ao ensino, mas um dos objectivos de vida fica definitivamente para trás.
“Se soubesse o que sei hoje, e a vida ensina-nos sempre muito, tinha primeiro feito o doutoramento e só depois é que me metia na política. Havia tempo para tudo e o destino seria o mesmo, com outro trajecto”, reflecte.
E os livros?
O professor, o político e o… escritor. Lá voltamos ao início. Cumpridas as primeiras duas tarefas, está em curso a terceira. Começou já há muito pelos livros técnicos ligados à sua área de formação, mas o antigo autarca avançou nos últimos anos para outras “histórias”, descortinando-se-lhe uma veia literária.
“De ter lido muito ao longo da vida, e continuar a ler, e não por alguma qualidade especial do Belmiro Moita, ou por alguma força exterior que eu não sei, consigo em determinados momentos escrever com muita facilidade”, atira o autor de “Tertúlia de Amigos”, “Dias de Caça” ou “Alienígenas em Conímbriga”. Aspira agora escrever um romance (“ando a tentar”).
“Vou escrever até que a minha mente funcione”, assegura Belmiro Moita da Costa, aos 71 anos. Cheios de vida.
Belmiro, pai de Nuno
Belmiro Moita afirma conviver bem com o facto do filho Nuno lhe ter seguido as pisadas e ser hoje o presidente da Câmara Municipal de Condeixa.
Admitindo que “fica-me mal dizer o que quer que seja” sobre o seu desempenho, regista contudo que este “está a fazer muito melhor do que muita gente talvez pensasse, assim como eu próprio”. Orgulho de pai.
LUÍS CARLOS MELO
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